SALA DA TEACHER DAIA | Quem cuida do professor?

"Algo muito ruim está acontecendo: professores estão em seu limite emocional dentro da escola, pois não têm espaço para se sentir melhor"

Por Daiana Souza*


São tempos difíceis para todos. A polarização nacional trouxe as discussões políticas para a sala de aula, acirrando o ânimo de alunos, professores e pais. A economia cambaleante fez com que famílias sofressem com a iminência de desemprego e preços altíssimos no supermercado.

Hoje pensamos se é melhor comprar um caderno ou um litro de leite. A matemática doméstica não fecha. Eu entro em sala de aula e sinto pairar um tipo de nuvem pesada, como se fosse chover na cabeça de todo mundo. Não há guarda-chuva para todos, nem marquise para se abrigar.

Seria melhor se essa nuvem fosse apenas de água, mas na verdade ela é carregada de sentimentos. E nós, professores, sentimos isso dia a dia, ao olhar para um aluno triste com o distanciamento dos pais, que também estão angustiados com o dia de amanhã; temos que lidar com xingamentos dos alunos, da falta de vontade de participar, da bagunça e do uso do celular, que - convenhamos - é um concorrente desleal quando precisamos da atenção de nosso aluno.

Aquelas crianças ou adolescentes não são responsáveis por esse retrato complicado, pois eu acredito que elas são fruto do que nós, adultos, produzimos em volta delas. Acredito que nós, adultos, não estamos conseguindo cuidar de nós mesmos, por isso estamos criando essa atmosfera hostil que permeia nossas casas, nossas escolas, nossa vida em comunidade. Estamos deixando a angústia e a revolta tomar conta de nossa rotina. Não paramos para respirar e pensar.

Para algumas situações temos alternativas: procuramos psicopedagogos, psicólogos e profissionais de toda sorte para nos ajudar a dar conta das demandas escolares, quando nossos filhos apresentam alguma dificuldade; adultos podem procurar terapia para dar conta das demandas emocionais da vida.

Mas certas perguntas não saem da minha cabeça: quem cuida do professor?

Quem cuida de suas demandas emocionais, principalmente ligadas ao desgaste do trabalho em sala de aula? Quem cuida do professor quando um aluno tenta agredi-lo? Quem cuida do professor quando os pais o acusam de fazer lavagem cerebral dentro de sala de aula, mesmo sem nunca ter assistido a aula do filho? Quem cuida do professor quando ele está cansado de tanto usar os finais de semana para corrigir provas e preparar aulas, para que seus alunos sigam sua trajetória de aprendizagem de maneira eficaz e responsável?

Quem cuida do professor quando ele fica doente, mas precisa dar aula porque não há substitutos? Quem cuida do professor? Entendo que o professor é um adulto e pode procurar a tal terapia, como citei anteriormente, mas eu falo de um cuidado que vai além da terapia.

Falo de um olhar com mais carinho e preocupação para aquele adulto que está atuando em sala de aula, que faz parte de uma rede de relacionamento formada por alunos, pais e chefes. Eu posso procurar por terapia fora da escola, como qualquer pessoa. Mas eu gostaria desse outro olhar, que é múltiplo e que precisa ser considerado dentro da escola como instituição.

Por que não há um espaço dentro da escola para acolher esse professor triste, cansado, surtado? Não falo da sala dos professores, que às vezes parece ser um ambiente ainda pior de se estar, com tanta queixa e fofoca. Falo de um local seguro, onde eu, como professora, pudesse falar sobre o que eu sinto, sobre o que me angustia e me irrita dentro da sala de aula.

Somos humanos e podemos cometer erros, perder as estribeiras de vez em quando. Mas algo muito ruim está acontecendo: professores estão em seu limite emocional dentro da escola, pois não têm espaço para se sentir melhor. Os alunos, coitados, vêem o professor se sentindo mal mas ficam de mãos atadas, pois não sabem o que fazer.

A escola é um espaço formado por múltiplas realidades. E essas realidades carregam uma mistura de sentimentos que precisa ser olhada com mais carinho por todos. No fim do dia, um abraço do aluno até nos ajuda a aliviar os fardos, mas infelizmente não é o suficiente. Precisamos de mais atenção. Na verdade, todos precisam.

*Publicitária e professora de inglês. Daiana Souza escreve quinzenalmente neste espaço. Tem alguma dúvida, comentário ou sugestão a respeito do tema? Utilize os espaços abaixo para comentários