MÃE SEM LIMITE: A mãe perdida

A idealização que colocam sobre nós, mães, nos leva para esse lugar de eterna culpa. Parece que não conseguimos relaxar nunca. Que estamos sempre em débito.

Por Lola Carvalho*


Finalmente, consegui assistir ao filme A Filha Perdida, lançado pela Netflix, da diretora e roteirista Maggie Gyllenhaal, adaptado do livro de mesmo título (que ainda não tive a oportunidade de ler) de Elena Ferrante.

O filme conta a história de Leda, uma mulher que vai passar férias em uma pequena ilha da Grécia, deixando suas duas filhas (já adultas) com o pai, do qual ela é divorciada. Lá, sua história vai se cruzar com a história de Nina, uma jovem mãe, visivelmente exausta com a maternidade e atormentada pelo seu marido, pouco presente e de conduta duvidosa.

Nina é como um espelho para Leda, fazendo com que ela acesse suas memórias mais profundas de um tempo em que decidiu abandonar suas filhas ainda pequenas e dependentes, para viver seu sonho de investir na carreira acadêmica e em um novo amor.

Conhecer a história de Leda, me causou desconforto em vários momentos, porque para a nossa sociedade a mãe é aquela que tudo suporta, que busca forças de onde não tem, para dar o melhor para o seu filho, mesmo que isso signifique se anular como pessoa.

Este lugar de abandono culturalmente, sempre foi dos pais. É muito mais comum o homem investir na carreira, abandonar a família para viver uma paixão, não assumir o filho, abrir mão da guarda, não pagar pensão e, via de regra, os homens não precisam abrir mão de nada ao serem pais. A responsabilidade maior, aquela que envolve o amor incondicional, o desejo de fazer tudo pelo filho é o lugar destinado às mães.

E ver uma mãe fazer exatamente o contrário de tudo o que seria “certo” é, realmente, desconfortável.

Mas quantas de nós já não quisemos estar sozinhas em uma praia (ou em qualquer lugar silencioso), sentindo a brisa no rosto, sem ouvir a palavra mãe por alguns dias, só para respirar um pouco e lembrar de quem somos?

Quantas de nós, já sentimos vontade de largar tudo e sair correndo, sem olhar para trás? Quantas de nós, já não sentimos uma culpa avassaladora por ter sequer pensado nesta hipótese?

Leda deixa as filhas por apenas um período da vida delas, mas a culpa que sente a atormenta de uma forma tão cruel, que é como se ela nunca tivesse voltado.

A idealização que colocam sobre nós, mães, nos leva para esse lugar de eterna culpa. Parece que não conseguimos relaxar nunca. Que estamos sempre em débito. Que tudo é culpa da mãe (Freud estava errado).

Leda faz algo extremo. Ela abandona tudo para viver o seu sonho. Naquele momento ela não pensou em equilibrar a maternidade com a carreira e com a vida amorosa.

Eu acredito numa maternidade livre de rótulos.

Onde podemos sim, ser boas mães mesmo com uma carreira bem sucedida. Onde podemos ir em busca de um novo amor, sem ter que abrir mão dos filhos. Onde podemos ter tempo para uma viagem sem filhos, mesmo que seja sair de manhã e voltar à noite. Ou mesmo que seja sair por algumas horinhas para rir com as amigas.

Eu não quero abrir mão de nada para ser mãe. A não ser que isso não signifique abrir mão de mim. É claro que quando escolhemos ser mães, vamos precisar fazer muitas escolhas difíceis. Mas não precisamos fazer isso sozinhas.

Ser mãe, me ensinou (e ensina todos os dias), que a maternidade pode ser maravilhosa, se abandonarmos esta capa de super heroína que insistem em nos colocar e entendermos que por trás da mãe, existe uma mulher de carne e osso, com seus desejos, sonhos, falhas e potências.

Não precisamos nos perder de nós mesmas para provar que amamos nossos filhos.

Se você ainda não assistiu o filme, recomendo muito.

Espero que este texto tenha feito sentido para ti. <3

*Lola Carvalho é publicitária, jornalista e mãe de dois. Sempre foi apaixonada pelas palavras e pela música. É gaúcha de São Sebastião do Caí, mas aos onze anos mudou-se para Novo Hamburgo. Com o nascimento do primogênito, Francisco, em 2009, viveu a maior transformação da sua vida. A maternidade trouxe à tona sentimentos novos e singulares. Tudo isso foi sendo registrado em textos escritos pela publicitária que encontrou nas palavras uma forma de externar seus medos, frustrações, desafios e falar do amor que crescia dia após dia.Com a chegada do Caetano, seu segundo filho, a maternidade se revelou em novas páginas, que foram reunidas em seu livro de estreia Mãe Sem Limite: um livro de crônicas que trata sobre as aventuras e desafios de ser mãe. Site: lola carvalho.com.br

e-mail: lolacarvalho75@hotmail.comfacebook: @maesemlimiteInstagram: @lolacarvalho
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